Faz tempo. Era 2014 e vi esse enorme arlequim esquecido no chão, exposto ao sol a pino, exposto ao sereno e à chuva. Ele se desmilinguia de dar dó e fiz essas fotos. Olhando-as depois me veio à mente a palavra brasiliana. Sua sonoridade agradou e ela tinha majestade. Brasiliana: coleção de estudos, livros, publicações, filmes, músicas, material visual, etc. sobre o Brasil.
Pois então esse arlequim estropiado falava do Brasil. E esse Brasil não era o do gigante deitado em berço esplêndido mas o dum bonecão oco, tombado no lixo. Nada a ver com a idílica ideia de um Brasil brasileiro, cordial, brincalhão, festeiro que a gente alimenta em nosso imaginário ao som da aquarela do Brasil.
Esse Brasil arlequim das fotos brilhou um dia feliz desfilando na avenida em ritmo carnavalesco. A chuva e o sol lhe apagaram o brilho e ele perdeu a graça.
O Brasil perdeu a graça. Já não importa como nem quando.
Importa que para além de perder a graça, não se torne um país triste. Precisamos empenhar toda nossa energia cívica para que isso não aconteça. Hoje o país se divide em campos antagônicos e as pessoas, as famílias, os amigos se espezinham digladiando-se com meias verdades, com falsidades, com leviandades em geral acompanhadas nas redes sociais com a patética risada virtual kkkkkkkkk, na euforia de estarem fazendo boa política.
Não estão não. A boa política deve desarmar e não armar as pessoas. A boa política deve unir e não desunir. A boa política deve estimular o amor e não o ódio. A boa política deve reverenciar a cultura e não apequená-la.
Imagens muito mais chocantes de que a desse indigente arlequim são as do incêndio do Museu Nacional. Parece que elas foram premonitórias do inferno em que o país mergulharia logo em seguida, rachado entre extremos. Mas esses extremos não são iguais nos pecados que carregam. Nesse momento, é vital deixar a emoção de lado e usar a razão nos orientando em direção a mais lúcida escolha.
Uma escolha que não nos lance na vertigem da ignomínia e destrua a pouca empatia que ainda sobrevive entre nós. Uma escolha que não instigue a proliferação de grupos como o Movimento Brasil Livre que insensatamente achincalhou artistas, obras, exposições, museus.
Uma escolha que sim nos mantenha respeitando nossas diferenças e com liberdade para expressá-las. Uma escolha que sim nos afaste do rancor e nos aproxime da tolerância. Uma escolha que sim nos faça alegres, não tristes.
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