festa na praça
coluna de opinião da série foto em foco
Márcio Pannunzio, texto & fotos
apesar de você, amanhã há de ser, outro dia …
Trilha sonora dos anos de chumbo, a música que virou hino contra a ditadura, alegrou a festa na praça. Uma outra do mesmo compositor, poderia ter sido também cantada porque bem ilustraria aquele momento.
foi bonita a festa, pá, fiquei contente, e ainda guardo, renitente, um velho cravo para mim …
A praça da igreja matriz, a praça do coreto em São Sebastião foi ocupada no dia 13, uma quinta-feira, no final da tarde, por uma gente contente de ali estar toda junta celebrando a democracia e o desejo de virar logo uma página infeliz da nossa história. Mas para não empanar sua alegria, não conviria dançar, a estrofe seguinte:
já murcharam em tua festa, pá
mas certamente
esqueceram uma semente
em algum canto de jardim
O povo esperançoso a despeito da adversidade desses anos de agora perversos feito os de chumbo, sabe que mesmo desbancando da presidência Jair Bolsonaro, ainda assim enfrentará a oposição truculenta da sua tropa de choque, uma quinta coluna incansável a serviço de sabotar a nação. Então, pra que não murchem os cravos do jardim, o trabalho de resistência e de reparação precisa continuar muito além do próximo dia 30.
Essas pessoas que se manifestaram publicamente, sem medo, festejando seu companheirismo numa luta política renhida, são sofredoras. Faz tempo que dormem mal; acordam em sobressalto, o coração aos pulos, a boca seca respirando uma agonia que envelhece o corpo e empalidece o mundo.
No clássico filme de terror de 1956, invasion of the body snatchers, moradores duma cidadezinha, quando adormeciam, eram substituídos por clones sem humanidade que se portavam da mesma maneira de antes; mas suas ações eram desprovidas de sentimento. Aqueles que continuavam humanos percebiam a diferença e se desesperavam.
Nesse mesmo desespero vive hoje e vem vivendo faz anos, essa gente que anseia e luta para que a civilização triunfe sobre a barbárie e que, enfim, superando nossas diferenças e voltando a nos respeitar, haja união para reconstruir o Brasil esfrangalhado.
É certo que por mais diferentes que sejamos, existem valores que comungamos capazes de balizar nossa interpretação dos fatos produzindo conclusões parecidas.
Lastimavelmente, para uma parcela expressiva da sociedade brasileira, a que abraça o bolsonarismo, os fatos não importam. Essa corrente da direita extremista reacionária e populista, longe de elaborar seu discurso calcado em dados objetivos e inteligíveis, fala ao irracional que nos habita. Incitando seus adeptos a viver por dogmatismo, pela fé cega, furta-lhes qualquer capacidade de entendimento da realidade.
De certa forma, a exemplo do filme pesadelo mencionado, – vampiros de almas -, na tradução brasileira -, as mais radicalizadas perderam a sua humanidade e militam numa turba estúpida imbecibilizando whatsapp de família e grupos, barbarizando em encontros sociais, demonizando ambiente de trabalho, infernizando cultos religiosos… Turba escrota feito aquela que o país inteiro viu, abismado, se portando como milícia bêbada no Santuário de Aparecida no dia 12 passado. Agredindo todos que não rezassem por sua cartilha delituosa.
A boa parte desse eleitorado malsão há de despertar desse transe maligno no futuro e feito os eleitores do Collor, do Maluf, do Quércia, do Fleury, do Aécio Neves ou de outros tantos políticos que a distância e o tempo arruína merecidamente a reputação, se dará conta, envergonhada e arrependida, da sua escolha catastrófica.
No melhor dos sonhos, o país se pacificaria como na canção do Célio Piazza e Deo Lopes:
meu coração sobrevoa a cidade aflita
e descobre que nos olhos de cada pessoa
uma força boa brilha e se refaz
e se cada coração se pacifica
a cidade inteira vive em paz
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