FORA, pobraiada! coluna de opinião Foto em Foco Márcio Pannunzio, texto & fotos
O sol nasce para todos. É fato mais que crença e gente de todos os credos e mesmo gente sem crer em qualquer credo, nisso acredita.
Mas se para todos nasce, nem todos tem seu lugar para nele se aquecerem pois que os gestores do turismo de Ilhabela e Caraguatatuba, conforme matéria do Nova Imprensa informa, se uniram em conluio numa cruzada celebrada feito fato dadivoso contra o turismo de um dia; tão dadivoso quanto o sol nascer para todos. Se escudando no pretexto de “fiscalizar”, de engendrar uma “ação integrada para o bem comum”, o subtexto é o da criação de uma barreira rodoviária com risco de ter um caráter higienista. Espanta saber da adesão acrítica a essa política do Consórcio Circuito Litoral Norte e também dos secretários de turismo de Bertioga, Ubatuba e São Sebastião.
Assim, parte dos pejorativamente alcunhados pés-rapados das periferias que aboletam à prestação ônibus, vans e até kombis, o sol nascer nos pés da serra do mar não vai ver. Não é bem-vinda nessas cidades que apregoam viver do turismo.
Turismo no pensamento tosco e preconceituoso duns deve ser mesmo coisa só de gastador e esses são sempre por essas plagas daqui muito queridos e bem recebidos mesmo sendo muitos deles, mal educados, grosseirões, trogloditas. Se esparramam folgazões pelas cadeiras que empesteiam encalacrando a faixa de areia das praias erigindo um campo aboletado de obstáculos para se regalarem pantagruelicamente de frituras e se embebedarem copiosamente de cerveja e batidinhas de cachaça em contas que se pagam com notas de garoupas azuis para depois roncarem regurgitando peidorentos e babosos o sono dos glutões nos quartinhos de aluguel dos solícitos moradores proprietários ávidos de estrelas escravos do airbnb e booking ou nos quartos melhor ajambrados dos hotéis e pousadas dos empresários sal da terra empregadores pagadores de impostos.
Essa turistada desabonada de um dia que não se veste de grife ou quando veste, veste imitação, deixa como mais forte lembrança, o seu encantamento pelo lugar que visita e não a dinheirada que nele esparrama. Apesar disso, sacrificando seu apertado orçamento, sempre compra alguns produtos no comércio e sempre alguma lembrancinha leva, valorizando o artesanato local, considerado cafona por muitos dos venerados ricaços.
Ela chega sem causar perturbação, sem entupir as ruas desses suvs bólidos de guerra da moda, essa sim sem dúvida cafona e que rende foto de montão lacrando nas redes sociais de moradores revoltados mostrando congestionamentos gigantescos. Caminha, saudavelmente ou usa o transporte público. E muitíssimo menos lixo produz do que os endinheirados amantes compulsivos e perdulários do consumo supérfluo.
Pois então se pergunta: por que esses tão sapientes servidores a soldo do turismo municipal formados nos templos de universitário saber, ao invés de execrarem essa gente que é humana sim, não criam condições para a bem receber? Pois se todos tem lugar ao sol, ela também o deveria ter.
O problema é que pobre no Brasil e ainda mais nesse momento macabro duma governança de capetas a serviço duma burguesia ignorante, reacionária e desumana, é cancro e não gente como a gente.
Isso tem nome. Os sabe-tudo do turismo deveriam saber esse nome: aporofobia.
Se forem os valores iluministas resgatados do limbo em que a ultra direita brasil pária odiado brasil os jogou, esse preconceito contra pobre haveria de ser equiparado ao racismo e houvesse um poder judiciário funcional e câmaras de leis verdadeiramente cidadãs, como o racismo seria enquadrado feito crime. Nesse realmente esplendoroso dia, esses çábios do turismo aporofóbicos não seriam louvados pelos patrícios, mas achincalhados pela turba do politicamente correto e prontamente cancelados pela guerrilha da lacração.
O mal do Brasil nunca foi a saúva, mas a sua desigualdade social absurda, surreal, nefasta e tão patente aqui no litoral onde o pé de chinelo caminha perigosamente no meio fio lado a lado com o carrão de milhão do bacanaço da capital porque calçada nem existe.
Obra de revitalização milionária em bairro de Ilhabela suprime as calçadas e planta postes no meio da rua, violentado todos os preceitos do urbanismo humanista, o novo urbanismo, que prioriza a mobilidade urbana ativa, – caminhar e pedalar -, em detrimento do transporte automotivo que desumaniza e adoece a cidade. ( fotos: Márcio Pannunzio )
Fato que é fato e não opinião, é que essa pobraiada turista de um dia não causa dano digno de nota no litoral. Sua alegria de aqui estar por um punhado irrisório de horas depois duma viagem extenuante não merecia ser categorizada como incivilidade, deseducação, maus modos ou irresponsabilidade.
Os verdadeiros vilões são os ricos. Esses que alimentam com o consentimento e incentivo dos maus políticos, dos jornalistas vendidos e dos juristas lenientes, o monstro da especulação imobiliária que destrói nossas praias todas conforme nos conta o jornalista João Lara Mesquita do Mar Sem Fim. O alarido que nasce na própria sociedade civil ignorante das mazelas do progresso a qualquer preço clamando os poderosos pelo maior e mais egoísta conforto dos seus umbigos desmantela o belo, legitima o feio. E disso nos alertava com firmeza o combativo jornalista Nivaldo Simões.
Ilhabela com seu orçamento bilionário bem que poderia além de bem recepcionar os turistas de um dia, dar vida decente aos moradores pobres demais da cidade, lançando um programa de renda mínima com real potencial de provocar uma transformação social virtuosa incrementando e fortalecendo o bem comum.
Escolheu porém sonhar ser balneário Camboriú, esse lugar pavoroso e patético tornado cortiço de rico. Os milhões públicos insulares talvez se prestem a aumentar a faixa de areia das suas praias, logo permitindo que a Avenida Princesa Isabel engorde como a Paulista e daí num pesadelo cruel de cidade dum futuro distópico, Ilhabela toda igual Camboriú se emuralhe veloz sombreando a areia para consagrar o aberrante fato de que nela o sol não mais nascerá para ninguém; nem para pobres, nem para ricos.
esse não
essa sim
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