foto em foco: o cobertor curto de Ilhabela

O cobertor das autoridades para proteger os munícipes da pandemia em Ilhabela é curto.

Moradores que zelavam pelo valor do seu dinheiro se acostumaram a fazer suas compras de alimentos, bebidas e produtos de higiene e limpeza no continente, em atacadistas, onde a diferença de preços em relação aos praticados na ilha chega a mais de cinquenta por cento.

Com a interdição da travessia, essa prática tornou-se impossível.

É certo que se pode atravessar para o lado de lá. O problema é voltar para cá depois. Sem autorização, não se volta. Aí o morador econômico se veria com seu carro cheio de compras parado em São Sebastião, sem chance de chegar a sua casa.

A coluna testou o processo de autorização feito em site especial. Atividade jornalística está elencada ao lado dos serviços essenciais; esses que não podem parar porque se o fizessem, colapsariam a sociedade. Informação nessa pandemia é bem de primeira grandeza.

O Nova Imprensa como sucessor direto do finado Imprensa Livre é um portal jornalístico que exerce com propriedade sua atividade. Se não tem até hoje uma versão imprensa, isso não significa que seja porcaria. Muito ao contrário, é um sinal que faz jus ao adjetivo “livre” do jornal impresso diário que fez história de três décadas no Litoral Norte.

Existe quase uma dezena de semanários impressos na ilha. Mas é decepcionante dizer que a maior parte deles funciona na base do copiar e colar em cima dos comunicados da assessoria de imprensa do município. São sua extensão privada. Funcionando à custa da publicidade oficial de página inteira que os mantém ativos e enriquece seus proprietários lambe botas.

Para confirmar a veracidade desse juízo, basta estender sobre uma mesa espaçosa uma meia dúzia deles ao menos, lado a lado e ler com atenção suas matérias de capa. Todas são idênticas. Afastando a hipótese sem pé nem cabeça de que os “jornalistas” desses veículos tivessem tido a mesmíssima inspiração, se comprova a nefasta função de se prestarem ao papel de caixa de ressonância do poder público.

Então, se o Nova Imprensa subsiste à duras penas apenas virtualmente, isso sinaliza a sua integridade. Por isso, quem aqui assina seu nome e ainda que o faça em coluna de opinião, deve e merece ser considerado jornalista.

No caso do articulista da foto em foco, existe também o trabalho de fotojornalista como fotógrafo parceiro da Agência Foto Arena, uma das mais respeitadas do país.

A quebradeira da imprensa no mundo inteiro não é recente. As redações se esvaziaram não só de repórteres, articulistas, editores, revisores, enfim, profissionais do jornalismo, mas também dos fotógrafos.

Foram quase todos despedidos. Uns poucos ainda continuam trabalhando de carteira assinada.

Resultando que o protagonismo da fotografia jornalística passou às agências que funcionam como bancos de imagem para uso editorial.

A Foto Arena abastece os principais veículos de imprensa do Brasil. O articulista da foto em foco sobe suas pautas diretamente para o portal, sem mediação. O que significa que a empresa respeita e confia no seu trabalho.

A possibilidade de fotografar com liberdade sem ser discriminado por editor de fotografia chato, pentelho que fica pondo reparo em foto ou pauta, não tem preço. Essa mesma liberdade existe no Nova Imprensa.

O que se publica no espaço da coluna foto em foco sobe diretamente do PC do articulista para o site do portal. Sem editor melindrado ou patrão baba ovo de autoridade insular levantando objeção: pega leve; fala isso não; essa não é nossa linha; tá muito grande esse seu texto e por aí vai.

Se isso não é praticar jornalismo sério, independente, a gente fica sem saber o que é.

Pois apesar de apresentar essas duas credenciais jornalísticas, o pedido de passe foi recusado.

Todavia, essa recusa não deve ser vista como uma atitude imprópria. Foi prudente. Porque é melhor errar por excesso do que por desmazelo.

Aqui chegamos aonde se pretende chegar: as restrições para a travessia são pesadas e tem poder de efetivamente evitar comportamento leviano, ao permitirem que moradores fiquem num vai e vêm que pode prejudicar o combate à pandemia.

Nesse quesito, há proteção do cobertor das autoridades municipais.

Infelizmente, isso não vale para as medidas sanitárias da cidade que normatizam o funcionamento dos supermercados.

Foi motivo de intenso bate boca, quase uma centena de comentários, uma postagem feita no grupo reclame aqui Ilhabela no dia 4 de abril.

Ilustravam essa postagem duas fotos tiradas dentro dum supermercado, dos mais populares de Ilhabela.

Essas fotos mostravam funcionários e consumidores em situação de proximidade inadequada. Mostrava os funcionários atendendo sem máscaras.

Um dos comentários acusava a autora da postagem de ter tirado as fotos sem autorização das pessoas que apareciam nelas.

Neste ponto, convém abrir um parênteses.

Os frequentadores habituais das redes sociais tiram selfies fazendo caras e bocas ridículas. Alguns se fotografam seminus, em posturas sedutoras, eróticas.

Quando são fotografados por outros sem o saber, se indignam e aí vêm gritar essa besteira de ter de dar autorização.

Se o fotojornalista, o cinegrafista de jornalismo precisassem pedir autorização para todo mundo que enquadram em suas oculares, os meios de imprensa sairiam sem fotos e sem vídeos.

É uma idiotice e é um ato de má fé ficar brandindo na cara dos outros essa necessidade de autorização para fotografar.

Isso não existe. O direito ao uso de imagem já consolidou que é permitido sim fotografar as pessoas em espaço público, desde que haja respeito por elas, não as expondo em atitude vexatória.

Quer dizer que as fotos da postagem além de lícitas, são oportunas. Por terem valor jornalístico evidenciando uma situação que atesta que o cobertor das autoridades é curto. Cobre os pés descobrindo o peito.

O fato dos que advogam a favor do supermercado das fotos berrarem que o estabelecimento está cumprindo as determinações da vigilância sanitária municipal, que exige o uso de máscara somente no setor do açougue e de frios, longe de justificar a falta do seu uso pelos demais funcionários, expõe a gritante impropriedade do comportamento de dois atores.

Primeiro, o da própria vigilância sanitária que tem se mostrado lerda na adoção de medidas de proteção de maior eficácia.

O segundo, é do dono do supermercado. Se fixar nesse discurso rastaquera de que está cumprindo fielmente o que a vigilância sanitária relapsa exige, no momento em que outros donos de supermercado vão além e adotam as atitudes sensatas que sua empresa não assume, é hipocrisia.

O ministro da saúde está a todo momento na televisão como garoto propaganda do uso da máscara facial.

Ficar batendo na tecla de que elas não existem para todos também é resposta oportunista. Há gente demais as fabricando em suas casas. As máscaras de carpinteiro, marceneiro podem ser usadas. Há vídeo na internet mostrando a gambiarra de transformar cueca em máscara.

A verdade que qualquer leigo bem sabe é que o funcionário do supermercado pode ter contraído o coronavírus como se fosse uma “gripezinha” por ser jovem e sadio. Esse funcionário vai espirrar sobre alimentos na mercearia; espirrar sobre os pães da padaria; espirar sobre qualquer produto das prateleiras. Espirrar sobre os outros funcionários e clientes.

Os seus perdigotos infectados vão contaminar outras pessoas, podendo, inclusive, matá-las.

É esse o desenho. Feito com clareza para todos entenderem.

É isso.

Não adianta nada as autoridades ficarem obstaculizando o acesso à ilha até mesmo de quem é jornalista, se consentem com comportamento irresponsável no comércio.

O cobertor que cobre os pés não cobre o peito e a pandemia pode, infelizmente, encontrar campo fértil para semear a moléstia em Ilhabela.

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