sete de setembro

sete de setembro

Passada uma semana do sete de setembro, quando as pessoas tentarem se recordar de onde estavam naquele dia marco histórico, é bem capaz que lembrança alguma aflore à superfície do opaco lago da memória.

Certo que haverá quem tenha o fugaz gosto desbotado de reviver num lampejo o feriado prolongado tostando o corpo empalecido no sol fuzilante do litoral e o salgando no mar depois de embebedá-lo com caipirinha e cerveja; mas a maior parte das pessoas, provavelmente, lembrança nenhuma de peso e ou de relevo vai ter, a não ser a sensação modorrenta de que esse dia passou e se perdeu falecendo na contabilidade impiedosa dos dias mortos.

A multidão verde amarela que ocupou a Paulista e a esplanada dos ministérios vai ter sim mais que recordação intangível; vai ter foto e muita para exibir. Entretanto, pode ser que escolha não o fazer; que deseje mesmo, assassiná-las todas, as apagando do celular. Essas mesmas fotos feitas com tanto prazer e garbo varonil; essas mesmas fotos que comprovariam a presença cívica no evento maior de celebração do repúdio à tirania portuguesa. A história oficial conta que isso aconteceu de maneira cinematográfica e sem resistência, mas há quem conteste essa visão edulcorada como Lilia Schwarcz. A pintura de Pedro Américo, – o Grito do Ipiranga, tão tardiamente concluída, sonhou uma cena de mentira. Dom Pedro não se vestia com tamanho apuro envergando fardamento limpinho e nem montava um alazão; montava uma simplória mula e além disso, estava com caganeira, precisando se aliviar com frequência e foi por isso que parou a viagem naquele momento e lugar.

Como de logros não nos cansamos, a própria pintura tão efusivamente celebrada cheira a plágio, a saber, da 1807, Friedland, do francês Jean-Louis Ernest Meissonier.

Então a multidão bolsonarista que se bateu em defesa empedernida da liberdade de proclamar um regime que suprimiria essa mesma liberdade viveu seu logro: o de assistir, incrédula, acreditando ser uma fake news do nível dessas tantas que costuma com deslavado mau caratismo propagar, o seu presidente mito messias amarelar mais que o amarelo das milhares de camisetas todas elas juntas poucas horas depois de virilmente vociferar publicamente em Brasília e em São Paulo.

Porém, se o presidente amarelou, amarelou como vem há demasiado tempo amarelando, quem tem a obrigação constitucional de responder na proporcional altura ao autoritarismo em curso como cristalinamente destaca a jornalista Eliane Brum.

E na  órbita rasteira das ruas empobrecidas e degradadas, muita gente Brasil inteiro também amarelou, só que antes, no dia sete passado mesmo e escolheu não sair às ruas marcando posição contrária a dos embandeirados festivos feito torcida do escroto escrete canarinho inesquecivelmente derrotado fragorosamente por sete a um por medo de se envolver em encrenca com eles.
No Litoral Norte inteiro, apenas em Ilhabela houve manifestação de oposição, considerada por quem a viu e por quem dela participou, como a melhor, a mais impactante e criativa de todas as feitas. Pois essas fotos, marcando diferença das fotos dos bolsonaristas massa acéfala de manobra criminosa, vão ser para os que nelas figuraram, motivo de orgulho e prova de honradez e civilidade para ser exibida com prazer no futuro para outros verem assim como fazem os fotografados na passeata dos cem mil, na dos cara-pintadas e nas diretas já.

fotos: Márcio Pannunzio

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