Caiçaras de Castelhanos conquistam legalização do território tradicional

Uma antiga demanda das comunidades tradicionais caiçaras de Ilhabela saiu do papel no final de 2020. Dois dias antes de entregar o cargo, a ex-prefeita, Maria das Graças Feerreira, a Gracinha, assinou um decreto que cria a Reserva Extrativista (Resex) Baía de Castelhanos. O documento legaliza a posse das terras aos moradores, evitando processos recorrentes de especulação imobiliária no território.

Além de solucionar a questão fundiária das comunidades caiçaras que vivem na área, a Resex também terá papel importante na preservação ambiental, já que abrange o maior remanescente de restinga de Ilhabela e uma extensa área de manguezais. O local contempla aproximadamente 957 km² e um trecho de costeira com cerca de 25 km de extensão.

Casas na comunidade tradicional (Foto: Vitor Manoel)

O processo de criação da Resex teve início em 2014 com intuito de cumprir o direito dos caiçaras à terra, assegurado pela Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e pela Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais.

“Mais do que uma simples delimitação de terreno, a Resex vai garantir que os caiçaras possam manter seu modo de vida tradicional, retirando seu sustento da terra e do mar de forma sustentável, com seu respeito natural ao meio ambiente”, afirmou a procuradora da República Maria Rezende Capucci.

Patrimônio natural

A região contempla três dos cinco ecossistemas reconhecidos como patrimônio nacional pela Constituição – Serra do Mar, Zona Costeira e Mata Atlântica –, além de ser considerada reserva da biosfera pela Unesco, o que a transforma em um patrimônio natural de importância internacional.

Conselho

Para implantar a Resex de Castelhanos, será criado um conselho gestor provisório. O grupo terá a participação do secretário de Meio Ambiente de Ilhabela, João Graziano, ex-bolsonarista, recentemente nomeado pelo prefeito eleito Antônio Colucci, e pelos presidentes das associações Castelhanos Vive e Amor Castelhanos.

Segundo o decreto, três ações são prioritárias para o conselho: cadastramento da população extrativista que vive na reserva, elaboração de plano de manejo e assinatura de contrato de concessão real de uso dos recursos naturais pelos caiçaras.

Em seu formato permanente, o conselho gestor deve ter dois terços de sua composição ocupados por representantes das comunidades tradicionais. Além de solucionar a questão fundiária das comunidades caiçaras que vivem na área, a Resex também terá papel importante na preservação ambiental, já que abrange o maior remanescente de restinga de Ilhabela e uma extensa área de manguezais.

Especulação imobiliária em terra caiçara

O processo de compra de terras caiçaras por estabelecimentos turísticos e grandes empresário a baixos preços começou na década de 1970 no litoral paulista e explodiu nos últimos 20 anos.

Devido a proximidade de São Paulo, a maior metrópole do Brasil, Ilhabela foi forte alvo de especulação imobiliária e sua orla se tornou majoritariamente propriedade de segunda residência para turistas e já não existem comunidades preservadas do lado do continente – na parte urbanizada da ilha.

Canoa de pesca em Castelhanos (Foto: Divulgação)

Em Castelhanos e outras praias de acesso remoto, este processo tem sido mais lento e ainda é possível ver comunidades tradicionais pesqueiras que sustentam a cultura caiçara e o modo de vida ancestral. É o caso também do Bonete, Serraria, Búzios e outras, que ficam do lado de fora da ilha, voltadas ao oceano, e que preservam a exuberante natureza da Mata Atlântica, nascentes de água, cachoeiras e espécies da fauna nativa.

Os moradores que habitam esses territórios há gerações, em sua maioria, não possuem título de posse e nem recursos financeiros. A vida é baseada na natureza e nos saberes passados de pai para filhos e, por isso, a cultura é protegida por leis especiais, mas que não deixam de expor estas populações à riscos, como a especulação imobiliária.

É o caso da para de Indaiaúba, vizinha do Bonete no extremo sul da ilha, que foi comprada por um grande empresário do agronegócio, e teve o cenário e a dinâmica dos habitantes tradicionais completamente transformados.

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