A Semana da Cultura Caiçara é também a semana da Congada da Festa de São Benedito. É a terceira vez que a coluna retrata a Congada. Fotografar o evento sempre rende foto bacana; os dias de maio são de uma luminosidade especial, com céus azul royal e mesmo as horas mais quentes, não ofuscam a delicadeza da luz solar que ilumina o mundo com brandura.
A dança dos congueiros com uniformes magenta e azul celeste, cheios de adornos multicoloridos, ganha forte relevo e textura aveludada sob essa luz que maravilha não apenas o olhar dos fotógrafos ano a ano cada vez mais numerosos se acotovelando pelo melhor ângulo, mas da multidão que se derrama pelas calçadas.
Aí então, diante de um espetáculo tão belo, a gente se emociona e se pergunta o porquê da celebração da cultura caiçara ficar restrita a somente uma semana.
A Cultura Caiçara merecia ser comemorada o ano inteiro. E, se pararmos para pensar e tomarmos consciência de que Ilhabela, com seus mais de quarenta mil habitantes, há muito já deixou de ser terra de caiçaras, sendo terra de mineiros, baianos, nordestinos, enfim, brasileiros de tudo quando é canto do país e ainda pessoas de outras nacionalidades, por que não comemorarmos essas culturas todas?
Aliás, por que escrever a palavra cultura com C maiúsculo apenas nessa época?
Na verdade, a palavra cultura deveria ser empregada sempre assim, começando maiúscula, para nos lembrarmos da sua importância.
A Semana da Cultura Caiçara rende bastante propaganda impressa com foto bonita dos políticos locais a adulando. Todos eles se esmeram em brandir frases de efeito sobre cultura, boa parte delas rimada, no desejo de mostrar o quanto a respeitam e a admiram. É pena que essa admiração não resulte em projetos legislativos e executivos que a valorizem à altura da sua relevância.
Há muito show, há o Salão Waldemar Belisário, há oficinas de arte; porém, tudo isso, para uma cidade com os recursos humanos e financeiros de Ilhabela, é pouco, muito muito pouco.
Promover essa cultura com C maiúsculo exige ousadia e criatividade. Exige um planejamento apaixonado e menos burocrático.
Por ela, a gente poderia sonhar tão mais alto … Com um festival de cinema como existe em Paulínia; com uma feira literária como a de Paraty; com uma Ilhabela em foco a exemplo da famosa Paraty em foco; com festivais de música do calibre do Vento Festival – esse, infelizmente perdido para São Sebastião; com um festival de teatro como o Festival Internacional de Teatro de São José do Rio Preto; com festividades que revelassem o brilho da própria terra como acontece corriqueiramente na vizinha Paraíbuna, que mesmo sem contar com os royalties do petróleo, tem um calendário riquíssimo de festas populares …
Poderíamos ter uma Pinacoteca Municipal grandiosa tal qual a de Santo André, que possui centenas de obras de artistas plásticos hoje valorizados no mercado de arte, obras essas adquiridas ao longo de mais de quatro décadas de prêmios aquisitivos do Salão de Arte Contemporânea Luiz Sacilotto.
Poderíamos sediar um projeto com a envergadura do saudoso Parque Escultórico de São Sebastião, enriquecendo nossas praças e jardins com esculturas de consagrados artistas brasileiros. Poderíamos grafitar as paredes e os muros nus e degradados com arte que nos encantasse. Poderíamos ocupar nossos espaços expositivos com mostras dos nossos melhores artistas e de artistas renomados do Brasil inteiro e também de fora. Poderíamos forrar a fachada da Prefeitura Sauna de Cristal com gigantescas e bem feitas fotografias de Ilhabela e sua gente, jogando no lixo as pavorosas e mal ajambradas placas aluminizadas que podem fazer bom papel no serviço de impermeabilizar lajes, mas não no de proteger do sol o nosso principal prédio público. Poderíamos levar essa cultura com C maiúsculo para as escolas, fazendo nelas uma revolução do bem.
Poderíamos promover não uma meia dúzia shows popularescos pagos com cachês milionários, mas dezenas de shows de músicos regionais comprometidos com a criação de um repertório original e de alta qualidade.
Poderíamos finalmente inaugurar o Teatro Municipal que nunca termina com uma brilhante programação teatral. Poderíamos reativar a sala de cinema da qual nunca mais nada se falou. Poderíamos inaugurar um Museu da Imagem e do Som que se prestasse a documentar e preservar a cultura insular.
Tantos poderíamos seriam extremamente bem-vindos para sonharmos o máximo de ações que estimulassem a nossa cultura. Porque ela não deve continuar sendo tratada como um valor solitário – uma única semana perdida no calendário de eventos da cidade, mas como um valor solidário, que pode, realmente, sem dúvida alguma, tornar a ilha verdadeiramente bela.