Uma das minhas atividades no Instituto Federal, como professor, é orientar, no curso técnico de Administração, a elaboração de um plano de negócios. A proposta é que os alunos pensem em empreender como alternativa para geração de renda. O plano de negócio é um documento que permite identificar e avaliar uma oportunidade de negócio, seus riscos, sua operacionalidade e sua viabilidade.
Assim, os alunos são organizados em grupos e incitados a identificar possíveis negócios. Escolhe-se um deles e o plano é construído.
Os negócios propostos, na maioria das vezes, derivam das suas próprias carências com opções de lazer. Em outros casos surgem negócios mais audaciosos ou mais elaborados e algumas vezes mais criativos. Nem sempre são factíveis, mesmo se mostrando viáveis. O objetivo é fazê-los compreender como se inicia a análise de uma oportunidade de negócio.
No primeiro semestre de 2019 um dos grupos apresentou algumas possibilidades conforme solicitado. Um deles era uma livraria. No momento da escolha eu decidi “vocês vão fazer a livraria”. Alguns alunos gostaram, outros não. Eu expliquei que a livraria era fadada ao fracasso e o negócio seria inviável, caberia ao grupo explicar a causa. Especialmente aqui em Caraguá.
É importante notar que os alunos se empenharam e alguns queriam provar a viabilidade. Mas o que eu vaticinei do início, ocorreu: o negócio se mostrou inapelavelmente inviável. Este artigo se propõe a explicar a causa da inviabilidade.
Em primeiro lugar há uma transformação na cadeia produtiva. Renomadas editoras vêm se fundindo e formando grupos editorias que abarcam vários selos. Há ainda editoras individuais que atuam por segmento e algumas que trabalham por demanda atendendo a produção independente. Este fato cria uma pressão sobre as distribuidoras e sobre os varejistas, no caso as livrarias.
Além disso, as editoras fazem vendas diretas ao consumidor, podando a oportunidades das livrarias. O resultado está no momento dramático que vivem as livrarias, com as grandes redes fechando lojas e pedido recuperação judicial. Segundo dados da Associação Nacional de Livrarias perdeu-se de 20% das livrarias nos últimos quatro anos. Cabe observar que algumas livrarias com modelos alternativos de negócio.
Esta combinação de produção concentrada e crise na distribuição impacta negativamente na oferta. Só que isto é um problema estrutural.
Em segundo lugar o produto livro é caro. Cabe aqui uma crítica sobre o modo de produção como materiais que puxam o custo para cima e por conseguinte o preço. Há os ebooks e os áudios livros, cujo custo é menor, mas esbarra no hábito de leitura.
Sobre o hábito tem-se dois aspectos. Primeiro, que as gerações mais velhas não cultivam o hábito de ler em uma tela. A leitura de um livro é uma experiência multissensorial, o que os ebooks e os áudios livros não permitem. Segundo, as gerações mais novas não vão trocar o vídeo, a mensagem ou informação da rede social por um texto denso e que exige reflexão. Isto é uma questão sociocultural.
Provavelmente, o fato do livro ser caro e a falta de hábito podem justificar, em parte, a queda nas vendas em 20% em 2018, segundo a FIPE.
Há ainda um outro agravante o índice de leitura do brasileiro. Segundo Market Research World, que avaliou os hábitos de leitura de 30 países, mensurando o número de horas semanais dedicados a leitura, o Brasil ficou em 27º lugar com 5,12, a primeira posição é da Índia com 10:42 horas. Em média o brasileiro lê 2,43 livros integramente por ano, segundo a Pesquisa Retratos da Leitura no Brasil. Ainda segundo a mesma pesquisa, 44% da população não pratica o hábito da leitura e 30% dos brasileiros nunca compraram um livro na vida.
Na pesquisa empreendida pelos alunos descobriu-se que em Caraguá compra-se 1,48 livros por pessoa/ano, que leem 1,8 livro/ano, que 25% não leram nenhum livro e que 48% não compram livros. Os dados vêm ao encontro dos números nacionais, mas em patamar mais prejudicado. O que justifica o baixo número de livrarias na cidade: uma para cada 39.875 habitantes.
A análise econômica é simples: livrarias é um negócio inviável porque a oferta é concentrada e destrói o sistema de distribuição, o produto é caro, a demanda é escassa e pouco incentivada a crescer. E aqui em Caraguá a situação é um pouco mais prejudicada: enquanto eu escrevia este texto a livraria do shopping mudou o modelo de negócio.